sábado, 31 de março de 2012

Diagnóstico.

Passou uns meses internada dentro de si mesma, tomando soro de incentivo nas veias,
comendo apenas sopa de letrinhas. Uma época terrível aquela quando pegou a triste doença das bolas de papel.
Escrevia, arrancava a folha e jogava fora, tudo isso, repetidas vezes.
Dados estes sintomas, foi possível detectar coma em alguns órgãos entre eles a criatividade, inspiração e vontade acima.
Ficou durante um ano lutando contra esse mal, na fila do transplante por um coração novo.
Algumas enfermeiras boazinhas cuidaram dela e agora ela diz que está melhorando, foi uma fase - é o que ela costuma dizer.
O que importa é que durante todo este momento alguns amigos não a abandonaram: os livros.

Modernismo

A verdade é que alguns personagens, narradores, imagens, imaginações, sentimentos e angústias não cabem em mim.
Dividindo junto com as mágoas um lugar em meu coração, é isso, eles não cabem mais em mim.
Eles pegam carona na motoquinha do parágrafo, o garoto descolado da rua de baixo.
Eu deixo que todos eles me abandonem agora, daqui de dentro, para fora.
Depois eu chamo isso de escrever.

Importante

Aquele sorriso e aquele olhar anunciavam algo de bom que iria acontecer.
Minha vida jamais fora a mesma depois de você
Depois de muito tempo eu queria saber
O que eu poderia ser quando viesse a crescer.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Todas as cartas de amor são ridículas.

(Título provisório e intertextual)

Aqui, da época de moleque eu me lembro de uma menina. Aquela menina. Da escola, você sabe.
Aquela das festinhas com poesias, salgadinhos e tudo mais. Poxa, aquela da bolsa verde, como assim você não lembra?
Cara, ela andava sempre com a aquela bolsa verde. A baixinha....éeeeeee, é ela mesmo! Eu lembro dela....
Heim? Que pessoa? Quem? Fernando Pessoa? Ah, é verdade... ela gostava dele. Nessa época, na época dela, eu tinha um sonho e era tocar violão.
Eu sei, nessa época eu já tocava violão. Eu já era transtornado, eu escutava Jim e Janis e me perguntava quem eu era, qual a minha função no mundo.
Eu queria que a minha função fosse tocar violão porque ela cantava e cantava muito bem. Sonoramente doce, demais da conta. Olha, eu sempre tinha a impressão de que ao cantar ela olhava um bucadim pra mim.
Não sei, ela era uma menina discreta, embora chamasse muita atenção.
Um dia pedi para uma amiga que entregasse uma carta para ela. Era uma carta simples, era assim - Oi, você quer ser da minha banda?
Mas ela nunca respondeu. Cara, devia ser por causa desse Fernando aí que você falou...


domingo, 25 de março de 2012

Sobre ele.

Ele andava todo torto. Eu reconhecia-o pelo andar e achava que era dele aquele estilo.
Confessou-me que tinha uma perna maior que a outra.
Então não era estilo, não.
Era um charme.

Para Rafaela

A primeira vez em que partiu eu não esbocei nenhuma reação, como no dia em que chegou. Foi embora sem um abraço de minha parte, magoada que sou achei que não pudesse agüentar.
O tempo passou e por muitas vezes lembrei daquele ano novo e de tudo, sem saber se aquelas lembranças doíam ou traziam saudade. Acabei escolhendo saudade e um dia passeando pela estradinha existente em meu coração percebi que aquela passarinha continuava ali, pequenininha com as asinhas abertas. Já era tarde, a passarinha estava abrindo as asinhas para voar.
- Você pode até voar, passarinha. Eu deixei a portinha aberta para quando você quiser voltar.

Constatação.

Eu preciso fazer uma fisioterapia para os males do meu coração, é isso.

B.

Quando ela chega com as pontas dos dedos sem cor é que eu percebo que as coisas estão diferentes. Inevitável não perceber, há um ano e algumas aulas venho me dedicando a esta atividade quase que religiosamente, todas as sextas-feiras. Na verdade, acredito que ela colecione anéis, vários tipos deles, a moça do anel. Há um roxo, azul, vermelho e gosto de pensar que há uma gaveta cheia deles metodicamente organizados, do maior para o menor, do mais claro para o mais escuro..
Um dia resolvemos presenteá-la. – Um brinco? Um colar? – ele perguntou. A decisão foi tomada no dia seguinte quando um anel de coruja apareceu quase que voando diante de nossos olhos – é este, as corujas representam a sabedoria!
Naquele dia vimos o seu olhar brilhando ao colocar a pequena corujinha em seu anelar. Mas hoje o dia amanheceu sem brilho algum.